Ela me esperava, desde as sete horas...e eu cheguei minutos depois da oito, horário combinado. Eu me senti esperada, coisa rara hoje em dia. Ela veio lenta até o portão, sorrindo... Coque torcido na nuca, cabelo-paina contrastando com o rosto vincado de sol; perfumada de talco; vestido longo, branco bordado em branco, sandálias azuis baixas em fita. Sua figura, apesar da idade, mantém a forma feminina. O que me prende a atenção são os olhinhos azuis esverdeados, pequenos, estrelados; a coluna ereta, que mantém firme para não encolher mais; e o riso...
Sigo seus passos, como em câmera lenta; vejo uma fonte no jardim cuidado, a estátua de mulher, vaso no ombro que transborda pingos - gota a gota - da água na bacia. Barulhinho cadenciado, no ritmo de nossos passos silentes, plim-plim, plim...plim...
Sigo o rastro de seu perfume, e respiro o seu silêncio, sem pressa. A espera tem muitos rostos. Quanto maior o silêncio, mais ricos os desenhos das palavras. Não sei se meu atraso a leva a me contar de suas esperas. Quando criança, esperar era assustador: sua mãe que não vinha, ou quando pedia algo e ela demorava a lhe atender - sentia que seria devorada por uma bruxa. Outras vezes a espera era uma festa, na contagem regressiva para as férias da escola. Outra, ímpar, foi o instante em suspensão feérica - quando a orquestra e o público se preparam para o movimento primeiro do maestro de silêncio concentrado, quando esperava o maestro acaso favorecer o casual causado, nunca marcado, encontro com o amor juvenil, na esquina da sorveteria do Afonso. Outro tipo de espera, diferente, misturava desejo e medo, promessa de nova vida, desconhecida, quando deixou a casa dos pais.
De todas as esperas, aquela que acena com a liberdade, na saída da casa dos pais, ela sentiu como a mais longa e difícil, por ter rosto de esfinge.
Saber esperar é a condição inicial de liberdade, ela fala distraidamente, sem atinar ao que me provoca - um estado de lenta expectativa de transformação. Percebo que ando, sem ter sabido antes, à espera de...
Despeço-me dela, hora e meia depois...a cabeça e o coração funcionando em câmera lenta, entre sorrisos e acenos.
Toda vez que ouço suas histórias, alguma coisa canta e decanta, em um crisol. Meu olhar é de espera, agora, ele caminha gota-a-gota em direção a novo futuro: plim-plim, plim-plim-plim, plim...plim...
Maria Luiza Salomão, psicóloga, psicanalista, autora de A alegria possível (2010)