Ia sempre lá e ficava sentado junto ao tronco da árvore, deserta no descampado, cercada de capim rasteiro. Árvores de sitiantes cercavam-na. Longe, muito longe. Admirava-se de ninguém aparecer no belo descampado. Vez ou outra alguém ou algum animal surgia e desaparecia.
Naquela manhã, girando em torno da árvore, num exercício banal, ela apareceu. Nova como ele, bonita, sorridente. Não lhe perguntou o nome. Conversaram, sorriram, correram em torno da árvore. Sentaram-se cansados. Fizeram amizade e voltaram a se encontrar continuadamente. Giravam em torno da árvore, abraçavam-se, rolavam nas folhas secas e iam além dos beijos.
Abraçavam-se e giravam tanto no chão que, um dia, um espinho feriu o olho dela. Fisgada rápida. Ela gritou, levantou-se estonteada, ar de choro, e se foi correndo, mão tapando o olho. Chamou-a, chamou-a, e ela continuou correndo e desapareceu nas árvores distantes.
Procurou-a por onde pôde. Voltou à arvore diariamente. Nada. Não se conformava:
- Onde ela se meteu?
Saudade enorme. Lágrimas vinham aos olhos. Ia então perdendo o interesse de retornar à árvore solitária.
O tempo passou e trouxe a expansão da cidade, levando consigo a árvore deserta e as distantes, que a cercavam.
Não lhe fugia da memória o ponto exato da árvore deserta: um poste de iluminação pública e gente e carros circulando nos dois sentidos.
E na manhã enevoada retornou, mais uma vez, para junto ao poste.
Uma mulher, bem agasalhada, tampo escuro cobrindo o olho esquerdo, parou junto dele, segredou baixinho:
- Voltei.
A surpresa foi tanta que ele se viu entre folhas caídas, sob a árvore deserta, a rolarem no chão, aos beijos continuados.
Caio Porfirio, escritor, crítico literário, secretário administrativo da União Brasileira de Escritores, ganhador do Prêmio Jabuti