“Faço o Natal para a Ângela”- ela dizia e complementava: "Eu na realidade não gosto muito" - dizia isto em um meio sorriso, como que justificando a alegria da época e a urgência dos preparativos.
Eu intimamente me enchia de orgulho e pensava: "Que honra, não é? Que privilégio!” Havia um misto de felicidade e um misto de tristeza em pensar que ela fazia o Natal apenas por mim.
Lembro-me da nossa casa toda iluminada, dos amigos e parentes chegando e da minha mãe especialmente feliz neste dia.
Época do sonho, da gentileza, da boa vontade espontâneas.
Esta época sempre foi um prazer para mim. A alegria já começava em setembro.
Setembro é o mês mais bonito do ano. O clima é ameno sem ser agressivo e do nada você para e admira aquele ipê florido incrustado na calçada da principal avenida da sua cidade.
É um tempo de frescor, de aroma, de alegrias e promessas contidas no ar.
Ah! Como gostava desta época, como era felicidade plena me preparar para a primavera em setembro, meu aniversário em outubro e o Natal em dezembro. Era o que de melhor o ano podia reservar.
Havia no ar uma urgência em preparar as coisas. Em pensar o quê de melhor oferecer naquele dia.
A casa ficava agitada, cada hora chegava uma pessoa; minha mãe ria toda feliz, oferecia um café, um bolo, sei lá, algo que pudesse celebrar aquela visita, aquela época.
À noite quando chegava a festa, ela não parava de fazer e fazer coisas, até que inventei um Natal no restaurante para que ela pudesse descansar.
Felicidade! Lá ia ela deslumbrada com o que o buffet oferecia e dizia, “Sem precisar fazer nada, não é Ângela”? dizia maravilhada.
Minha mãe partiu bem no dia do meu aniversário e próximo ao Natal. Agora já faz seis anos.
De repente ninguém mais faz o "Natal para Ângela". Ninguém mais me faz dirigir mais de12 km dentro da cidade apenas para buscar um pernil que só um criador tinha.
Ninguém mais compra e seleciona as verduras para a tão esperada maionese do dia.
Ninguém mais.
Tudo agora tem que ser reinventado, criado, esperado, renovado.
Tudo tem que ser feito com o carinho que ela dispensava em tudo que fazia.
Ela não fazia o Natal apenas para mim... Fazia para os filhos, para os netos, bisnetos, genros, para sua família.
O lema usado para: ”Faço o Natal para a Ângela” e completava: “Porque ela gosta muito”, tem realmente o significado de que aquela época para mim era encantada, literalmente...
Esta época representava o que de melhor a vida continha.
Então entendi que ela se juntava ao meu sentimento para expressar o dela. Porque mãe e filhos são um só.
Ainda não consigo “fazer um Natal para mim”, porque gostava muito...
Ainda terão muitos Natais para aprender a fazê-los realmente para mim, gos-tan-do.